As comemorações do 1.º de Maio da UGT realizaram-se este ano com a organização de uma conferência sobre os desafios da negociação coletiva, que teve como oradores os antigos ministros do Trabalho Paulo Pedroso e José António Vieira da Silva.

Dada a situação de incerteza vivida no país devido à pandemia, a UGT decidiu não ir para a rua e assinalou o Dia do Trabalhador com a uma conferência transmitida nas redes sociais e com presenças limitadas no auditório.

Além da presença dos oradores, foram convidados para o debate os líderes de vários sindicatos da UGT que apresentaram a situação vivenciada e as queixas em matéria de negociação colectiva.

O arranque da sessão foi marcado pela intervenção do Secretário de Estado Adjunto e do Trabalho e da Formação Profissional, Miguel Cabrita, que contextualizou a atual situação da negociação coletiva e as consequências provocadas pela pandemia e as incertezas económicas e sociais. Para o membro do Executivo, o futuro da negociação coletiva terá de ser alavancado por uma recuperação económica sólida e ter em consideração a dinâmica anual da negociação coletiva.

 

Não é altura de discutir a lei do teletrabalho

Seguiu-se o debate do primeiro painel, que teve no início as declarações do ex-ministro do Trabalho e atual conselheiro especial da Comissão Europeia na área dos direitos sociais durante a presidência portuguesa da União Europeia (UE), José António Viera da Silva, que defendeu não ser altura para discutir a lei do teletrabalho.

“O teletrabalho tem de ser regulado com consciência que existe um pós-pandemia com características totalmente diferentes das atuais”, afirmou.

Além disso o antigo governante socialista destacou a importância da negociação coletiva como motor económico e social da sociedade e da política. Para Vieira da Silva, a negociação coletiva deve ser um apoio social para que os poderes públicos atuem e reduzam as desigualdades.

Seguiram-se as apresentações dos dirigentes do STE, SINDEQ, SETAAB, SPZC e STAS, que moderados pelo Secretário-geral adjunto da UGT, Sérgio Monte, deram a sua perspetiva relativa à atual situação da negociação coletiva, com os bloqueios sentidos nos diferentes sectores que representam.

Após a pausa para o almoço, os trabalhos recomeçaram com a apresentação do orador convidado, Paulo Pedroso, antigo ministro do Trabalho e da Solidariedade.  Dando nota da queda da negociação coletiva em Portugal, ressalvou que em comparação a outros países da OCDE a queda não foi tão significativa. Contudo voltou a salientar que existe uma incapacidade da negociação coletiva de antecipar algumas situações como o teletrabalho, o assédio, o trabalho intermitente, o encerramento temporário ou mesmo a diminuição da laboração. Paulo Pedroso deixou ainda o recado às organizações sindicais de que é preciso valorizar e incentivar a negociação perante a sociedade e as entidades patronais, sob pena de a regulação imposta desregular o sistema de contratação coletiva.

Os presidentes e secretários-gerais do SBN, SINAPE e SITEMA e o Secretário Executivo da UGT, responsável pela coordenação do gabinete jurídico da central, deixaram os seus contributos dos sectores e observações à apresentação do orador convidado.

A conferência terminou com os tão aguardados discursos político-sindicais da Presidente e do Secretário-geral da UGT, Lucinda Dâmaso e Carlos Silva, respetivamente.

 

UGT continuará na linha da frente para vencer os desafios do futuro

A Presidente da UGT, Lucinda Dâmaso, voltou a salientar a decisão responsável tomada pela central em assinalar o Dia do Trabalhador com a realização de uma grande conferência sindical, transmitida online para milhares de trabalhadores que acompanharam um tema forte e fundamental para todos: a negociação colectiva.

Numa mensagem forte, Lucinda Dâmaso recordou o trabalho invisível de milhares de trabalhadores e trabalhadoras que durante o último ano asseguraram os bens e serviços essenciais às populações. Deixando uma palavra de esperança a todos os que enfrentam as dificuldades provocadas pelo desemprego, a precariedade e a pobreza, assegurou que a UGT tudo fará para lutar pelos seus direitos e pela correção destas situações.

 

UGT insiste na continuidade dos apoios às empresas para pagamento dos salários

No tão aguardado discurso, o secretário-geral da UGT, Carlos Silva, disse que a UGT "não se exime à discussão" sobre o teletrabalho, mas sublinhou que "uma intervenção legislativa nesta matéria, num momento atípico e de incerteza, deverá esperar por outra oportunidade, onde a poeira dos dias assente e permita uma reflexão mais clarividente".

Para o líder sindical, a regulamentação do teletrabalho não deve ser feita no atual momento "atípico e de incerteza" que se vive devido à pandemia de covid-19.

Por outro lado, Carlos Silva afirmou que "se o parlamento quer legislar [sobre o teletrabalho], pois que o faça, obrigando as empresas a cumprir com o que já está no Código do Trabalho, desde 2003, sobre pagamento do subsídio de refeição, que muitas empresas se recusam a aplicar" e que legisle para que seja assegurado o pagamento das despesas com a energia ou telecomunicações.

Na sua intervenção, o secretário-geral da UGT considerou ainda que o Estado "cumpriu o seu dever" com os apoios criados no âmbito da pandemia e garantiu que a central sindical vai insistir para que se mantenham até à recuperação económica.

"O Estado cumpriu o seu dever, ao encontrar os mecanismos financeiros que permitiram atenuar, ao longo do último ano, os efeitos nocivos desta crise sanitária, que acabou por provocar uma crise económica e social, ainda de contornos incertos no futuro imediato", afirmou o líder sindical.

Segundo acrescentou, a UGT vai continuar a exigir a "continuidade dos apoios às empresas para pagamento de salários aos seus trabalhadores, enquanto a retoma da economia não acontece na sua plenitude e normalidade".

Carlos Silva afirmou que a central sindical vai insistir no apoio "a mais de 86.000 famílias que têm moratórias pendentes no crédito à habitação, que terminam em setembro próximo, e a que urge encontrar uma solução que seja socialmente justa e solidária".

"Rejeitamos os despejos selvagens de quaisquer famílias que não consigam cumprir com as suas obrigações contratuais ou fiscais", sublinhou o secretário-geral da UGT, defendendo que cabe ao Estado encontrar uma solução em diálogo com os parceiros sociais.

O líder da UGT deixou ainda recados ao Governo exigindo uma nova dinamização da negociação colectiva, "exigindo a todas as empresas que recorram à contratação pública que estejam abrangidas pela contratação coletiva, seja a nível setorial, seja ao nível da empresa. Há um acordo celebrado em 2018 com a UGT sobre o combate à precariedade e a dinamização da negociação coletiva. Aproveite-se, então, o momento para realmente a dinamizar e que passe a abranger mais do que o cerca de um milhão de trabalhadores abrangidos anualmente, metade do que existia em 2018.", sublinhou.

Carlos Silva assinalou ser essencial que Portugal abandone, "a breve trecho, o velho paradigma dos baixos salários" e que pare de justificar esta política com os baixos índices de produtividade.

"Cabe aos empregadores apostarem na inovação na redução de custos de contexto na articulação com o Estado e na melhoria das qualificações dos trabalhadores, onde a formação assume papel primordial, para ultrapassar o défice que ainda existe na área da formação", vincou.

Em relação aos processos de reestruturação da TAP e do banco Santander, o secretário-geral da UGT avisou, ainda, que o Governo "não pode assobiar para o lado e ignorar o que se passa no momento atual na vida do seu próprio país". Muito menos considerando que Portugal faz da dimensão social "pilar prioritário na sua ação na presidência da União Europeia".

Apesar das críticas, Carlos Silva também deixou elogios à ação do Governo durante a pandemia, em que conseguiu transmitir aos portugueses "uma sensação de tranquilidade e de serenidade contra o pânico, a incerteza e os populismos e demagogia que crescem e se revigoram à custa da dor do sacrifício e das tragédias dos povos".

"O maior inimigo da demagogia e do populismo é a seriedade e a verdade na governação e na vida pública. A vida pública está para servir os portugueses e não para servirem a si próprios e esta é uma situação que Portugal não esquece nem perdoa", atirou o líder da UGT.

Sobre o aumento do salário mínimo nacional, indicou que "é um imperativo ético nacional, mas também económico e social" e disse que a central sindical apoia "a implementação de um salário mínimo adequado nos 27 estados-membros".